Chegou talvez a hora da nossa revolução. Uma revolução de roupa rasgada, de povo a transpirar nos lençóis ao grito da guilhotina na janela. Uma revolução mais caseira do que a transmissão em directo do funeral do imperador. Uma revolução com flores na boca, com escamas na boca, com beijos saídos do duche na boca e corpos que se enxugam de orvalho com fome. Vamos fazer uma revolução com mãos aquecidas pelo forno, com óleo, com violetas, tambores e notas que transcendem o alarme disparado na biblioteca. Porque ao fim do nosso tempo damos ainda um abraço com beijo no parque, enquanto os negros cães nos ladram ocasionalmente, não por ódio, mas por saberem que um amor tão inscrito como o nosso no céu astral é venenoso neste bairro de ruas simétricas e encardidas. Vamos rapar o que nos sobra de animal e como jovens em liberdade grafitar este nosso amor tão fácil, grandioso e simples. É só o que nos resta contra o atraso, contra qualquer atraso, o do verão a morrer na tua boca, a chegada da maré ao teu umbigo, o fósforo que se acende sobre os romances do século, o cheiro a molotof na sumaúma das almofadas.
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